domingo, 16 de abril de 2017

Rachando a mania por óleo de coco

Não canso de repetir: a internet é uma ferramenta maravilhosa de busca e acesso à informação, mas devemos ter cuidado com a grande quantidade de besteira que circula na rede! Um dos últimos engôdos é citar a respeitada Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, para tentar justificar o modismo do “óleo de coco que tudo trata”.
Costumo sempre escrever meus próprios textos, mas para fazer frente a tanta lorota e mentira, desta vez vou apenas traduzir um texto publicado no blog de saúde da Universidade de Harvard, no dia 10 de abril de 2017, sobre o óleo de coco. Boa leitura!



Rachando a mania por óleo de coco

Julie Corliss, editora do Harvard Heart Letter

Se você buscar no Google "óleo de coco", verá uma enorme quantidade de histórias promovendo os alegados benefícios para a saúde desta gordura branca sólida, que é fácil de encontrar nos supermercados nos dias de hoje. Mas como pode algo que é repleto de gordura saturada - uma conhecida culpada em levantar risco de doença cardíaca - ser bom para você?
O coco tem algumas qualidades únicas que os entusiastas citam para explicar seus possíveis benefícios à saúde. Mas a evidência para apoiar essas alegações é muito frágil, diz o Dr. Qi Sun, professor-assistente no Departamento de Nutrição da Escola de Saúde Pública de Harvard.
"Se você quiser reduzir o risco de doença cardíaca, o óleo de coco não é uma boa escolha", diz ele. É verdade que o óleo de coco tende a aumentar o colesterol HDL, benéfico, mais do que outras gorduras, possivelmente por ser rico em ácido láurico, um ácido graxo que o corpo processa de forma ligeiramente diferente do que faz outras gorduras saturadas.

O efeito do óleo de coco sobre o colesterol

Mas não há evidências de que o consumo de óleo de coco possa diminuir o risco de doenças cardíacas, de acordo com um artigo publicado em abril de 2016 no periódico Nutrition Reviews. O estudo, intitulado "Coconut Oil Consumption and Cardiovascular Risk Factors in Humans", revisou resultados de 21 estudos, a maioria dos quais examinou os efeitos do óleo de coco ou produtos de coco sobre os níveis de colesterol. Oito foram ensaios clínicos, em que voluntários consumiram diferentes tipos de gorduras, incluindo óleo de coco, manteiga e óleos vegetais insaturados (como oliva, girassol, cártamo e óleo de milho) por curtos períodos de tempo. Em comparação com os óleos insaturados, o óleo de coco aumentou os níveis de colesterol total, HDL e LDL, embora não tanto quanto a manteiga.
Estas conclusões estão de acordo com os resultados de um estudo realizado pelo Dr. Sun e colegas na edição de 23 de novembro de 2016 do British Medical Journal, que examinou as ligações entre diferentes tipos de ácidos graxos saturados e doenças cardíacas. Comparado com outras gorduras saturadas (como o ácido palmítico, que é abundante na manteiga), ácido láurico não parece aumentar tanto o risco cardíaco. Contudo, é provável que o baixo consumo de ácido láurico da dieta americana tenha tornado mais difícil detectar qualquer tipo efeito, observa o Dr. Sun.

Dietas tropicais são diferentes

Os defensores do óleo de coco apontam para estudos de populações indígenas em partes da Índia, Sri Lanka, Filipinas e Polinésia, cujas dietas incluem quantidades copiosas de coco. Mas suas dietas tradicionais também incluem mais peixes, frutas e legumes do que as dietas típicas americanas, então esta comparação não é válida, diz o professor da Faculdade de Medicina de Harvard, Dr. Bruce Bistrian, que é chefe de nutrição clínica no Beth Israel Deaconess Medical Center.
Algumas marcas de óleo de coco disponíveis no comércio são rotuladas como "virgem", significando que são feitas através da prensagem da polpa do coco fresca, separando então o óleo. Tem gosto e cheiro de coco, ao contrário do óleo de coco refinado, clarificado e desodorizado feito a partir da polpa de coco seca, usado em alguns alimentos processados e cosméticos. Óleo de coco virgem contém pequenas quantidades de compostos antioxidantes que podem ajudar a reduzir a inflamação, um processo prejudicial que se acredita que possa piorar a doença cardíaca. Mas até agora, a prova de qualquer benefício possível é limitada a pequenos estudos em ratos e camundongos, diz o Dr. Bistrian.

Gorduras insaturadas

Em contraste, há uma riqueza de dados mostrando que dietas ricas em gordura insaturada, especialmente azeite de oliva, possam diminuir o risco de doença cardiovascular, Dr. Sun aponta. A evidência vem não somente de muitos estudos observacionais (como aqueles no relatório acima mencionado de BMJ), mas também de um estudo clínico espanhol pioneiro, que demonstrou que pessoas que consumiram uma dieta mediterrânea rica em azeite de oliva extravirgem ou em oleaginosas (castanhas, amêndoas, nozes) tiveram menor risco de ataque cardíaco, acidente vascular cerebral e morte por doença cardíaca do que as pessoas que seguiram uma dieta com baixo teor de gordura.
Claro, não há necessidade de evitar completamente o óleo de coco, se você gosta do sabor. Alguns padeiros usam óleo de coco em vez de manteiga em produtos assados, e o leite de coco é um ingrediente chave na culinária tailandesa e alguns pratos indianos. Apenas considere estas iguarias como prazeres ocasionais, não como uma obrigação diária.

Fonte do original em inglês:

Em resumo, o óleo de coco não é um suplemento, muito menos um medicamento. É um alimento como qualquer outro. A opção pelo seu uso é exclusivamente culinária, já que não há evidências que opere qualquer milagre pela saúde humana.

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

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