terça-feira, 30 de julho de 2019

Uso do liraglutide no tratamento do diabetes tipo 2

A glicose ingerida é capaz de estimular maior secreção de insulina que a glicose injetada. Interessante, não? Existe um sistema hormonal no nosso intestino que, de certa forma, avisa as células beta do pâncreas que os níveis de açúcar irão subir. O sistema incretínico é formado por peptídeos secretados pelas células do trato gastrointestinal. O GLP-1 é o mais estudado. Além de estimular a liberação de insulina, o GLP-1 diminui a velocidade de esvaziamento do estômago e têm efeito inibidor do apetite. Combo que além de potencializar o controle da glicemia, favorece a perda de peso. O problema é que o GLP-1 resiste no máximo 2 minutos na corrente sanguínea, pois é degradado por uma enzima chamada DPP-4. Para poder aproveitar os efeitos benéficos do GLP-1, a indústria farmacêutica desenvolveu remédios que resistem por mais tempo na nossa circulação. São os agonistas do GLP-1. O liraglutide (nome comercial Victoza) é um dos representantes dessa classe.



O liraglutide é um medicamento injetável, de uso diário, comercializados em dispositivos pré-preenchidos (as famosas canetas - veja na imagem). Apesar de não causar hipoglicemias em pacientes que não estejam em uso de medicamentos como insulina ou sulfonilureias, o liraglutide oferece efeito potente. Em média, a redução da hemoglobina glicada fica entre 0,8 e 1,2 por cento. Outra vantagem do tratamento é a redução do peso, que é bastante variável. Em média, perde-se cerca de 6 kg com o tratamento.
O liraglutide é considerado cardioprotetor quando usado em pacientes de alto risco. No estudo LEADER, 9340 pacientes com diabetes tipo 2 foram randomizados para o uso de liraglutide ou tratamento padrão. Os pacientes que fizeram uso do agonista do GLP-1 apresentaram risco 13 por cento menor de morrer de causas cardiovasculares, sofrer um infarto ou um acidente vascular encefálico durante o período de tratamento (cerca de 4 anos). Este efeito protetor ocorreu independente do controle da glicemia ou da perda de peso, isto é, o liraglutide ajuda, de fato, a prevenir eventos potencialmente graves.
Apesar de ter indicação precisa quando há alto risco cardiovascular, os dados sobre eficácia na prevenção de complicações do diabetes (retinopatia, neuropatia e nefropatia) em longo prazo ainda são escassos nos casos de baixo risco, que são a maioria dos pacientes. Em outras palavras, para uma pessoa com diabetes recém diagnosticada e sem complicações, ainda não sabemos com clareza se o liraglutide é definitivamente melhor que outros tratamentos mais antigos e mais baratos.
Quanto aos efeitos adversos, os mais frequentes são os gastrointestinais. Até 40 por cento dos pacientes têm náusea ou diarreia, especialmente no início do tratamento. Felizmente, isso costuma melhorar com a continuidade do uso. O medicamento também não deve ser usado em pacientes com história de pancreatite ou câncer medular de tireoide.

Referências:
1- Garber A, Henry R, Ratner R, Garcia-Hernandez PA, Rodriguez-Pattzi H, Olvera-Alvarez I, Hale PM, Zdravkovic M, Bode B, LEAD-3 (Mono) Study Group. Liraglutide versus glimepiride monotherapy for type 2 diabetes (LEAD-3 Mono): a randomised, 52-week, phase III, double-blind, parallel-treatment trial. Lancet. 2009;373(9662):473.
2- Marso SP, Daniels GH, Brown-Frandsen K, Kristensen P, Mann JF, Nauck MA, Nissen SE, Pocock S, Poulter NR, Ravn LS, Steinberg WM, Stockner M, Zinman B, Bergenstal RM, Buse JB, LEADER Steering Committee, LEADER Trial Investigators. Liraglutide and Cardiovascular Outcomes in Type 2 Diabetes. N Engl J Med. 2016;375(4):311.

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Doutor e Mestre em Endocrinologia - UFRGS
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

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