quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Consumo de café e diabetes mellitus

A cafeína é sem dúvida o estimulante mais consumido no mundo. O café, além de melhorar o estado de alerta e certos parâmetros cognitivos, está associado a uma menor incidência de diabetes mellitus tipo 2. Vamos entender como isso funciona e como podemos nos beneficiar deste potencial preventivo.



Apesar de alguns estudos de curta duração sugerirem que a cafeína possa induzir resistência insulínica, isto é, dificultar que a insulina exerça sua função de facilitar a entrada da glicose (açúcar do sangue) nas nossas células, estudos de longa duração mostram exatamente o contrário. O consumo regular tanto de café quando de chá verde/preto ajuda a insulina produzida pelo pâncreas a funcionar melhor e isto leva à redução dos níveis de glicemia após as refeições e à prevenção do diabetes. Ainda não se sabe qual o mecanismo exato por trás deste benefício, mas existem fortes candidatos:
- o consumo de café cafeinado está associado ao aumento dos níveis de adiponectina, hormônio que sabidamente reduz a resistência insulínica.
- o café cafeinado também está associado ao aumento da globulina ligadora dos hormônios sexuais, o que pode ser capaz de modular efeitos biológicos da testosterona e do estradiol nos tecidos periféricos que captam a glicose.
- a cafeína é capaz de ativar o transporte de glicose para dentro das fibras musculares independentemente da insulina, efeito similar ao do exercício.
- o consumo prologado da cafeína, em modelos animais, pode modular a sinalização através do IGF-1 aumentando a sensibilidade à insulina.
Independentemente do mecanismo, diferentes estudos já apontaram diminuição do risco de diabetes mellitus tipo 2 com o consumo do café.  O maior deles trata-se de uma revisão sistemática que compilou dados de 9 estudos e avaliou o efeito do consumo de café em quase 200 mil pessoas nos Estados Unidos, Europa e Ásia. Neste estudo, foi observada uma redução no risco de diabetes de até 35 porcento. O consumo de 2 xícaras por dia  já se mostrou benéfico, e quanto maior foi a ingesta (até 6 xícaras)  menor foi a incidência de diabetes. No entanto, como trata-se da análise de estudos observacionais, a relação causa-efeito não pode ser provada apesar dos fortes indícios. Logo, o consumo de café como estratégia para prevenção do diabetes não é formalmente recomendada.
No entanto, apesar de não serem definitivas, as evidências pesam sim a favor do café como potencial aliado contra o diabetes. Mas como se beneficiar deste possível efeito protetor? A dose de até 400 mg de cafeína por dia, que equivale a duas xícaras, é bem tolerada pela maioria dos adultos. Contudo, pessoas com enxaqueca, ansiedade, tremores, insônia ou arritmias podem piorar da sintomatologia mesmo ingerindo pequenas quantidades da bebida. Ou seja, consuma moderadamente e na dúvida consulte seu endocrinologista.

Fonte: Dam RM, Hu FB. Coffee consumption and risk of type 2 diabetes: a systematic review. JAMA. 2005;294(1):97

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Endocrinologia: uma especialidade de doenças prevalentes

O médico especialista em hormônios e no metabolismo

Todos sabem que o cardiologista cuida do coração, que o ginecologista cuida da saúde das mulheres e que o pediatra trata de crianças. Contudo, apesar de ser uma especialidade em franca ascensão, alguém, volta e meia, sempre pergunta: “O que faz o endocrinologista?”.
Endocrinologista é o médico especialista nos transtornos das glândulas endócrinas. Diferentemente das glândulas exócrinas, que secretam substâncias nas cavidades internas ou para o exterior do corpo, as glândulas endócrinas são responsáveis por secretar substâncias na corrente sanguínea. Essas substâncias são chamadas de hormônios.




Para que servem os hormônios?

Os hormônios são responsáveis por uma série de funções fundamentais para o nosso organismo. Entre estas funções estão a regulação do metabolismo, da reprodução, do crescimento e do desenvolvimento.


Quais são as principais doenças hormonais?

Distúrbios da secreção ou da ação dos hormônios podem levar a uma série de doenças. Entre elas, as mais comumente tratadas pelo endocrinologista são:


Por que tanta gente precisa do endocrinologista?

Os hábitos de vida modernos, caracterizados por alimentação inapropriada e sedentarismo, assim como o aumento da expectativa de vida, são os responsáveis pelos níveis epidêmicos de algumas destas doenças. Por exemplo, de cada 100 brasileiros, estima-se que em torno de 40 estejam acima do peso, 10 estejam obesos e 12 estejam diabéticos. Já o hipotireoidismo (diminuição da produção de hormônios pela glândula tireoide) pode acometer cerca de 10 em cada 100 pessoas.
Uma vez que o médico endocrinologista está sendo cada vez mais requisitado, é importante que todos conheçam a abrangência da Endocrinologia como especialidade. Isso fará com que a população saiba procurar por este profissional quando necessário, garantindo assim tratamento qualificado para os problemas em questão.

No vídeo, explico um pouco mais sobre a Endocrinologia.



Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista titulado pela SBEM
Doutor e Mestre em Endocrinologia pela UFRGS
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

Conteúdo revisado em 26 de abril de 2020.

terça-feira, 13 de outubro de 2015

Fatores de risco endocrinometabólicos do câncer de mama

Globalmente, o câncer de mama é a malignidade mais frequentemente diagnosticada e a principal causa de mortes por câncer em mulheres. Cerca de 50% dos casos de câncer de mama podem ser explicados por fatores de risco conhecidos. Estes por sua vez, podem ser modificados por mudanças socioambientais ou no estilo de vida. Discutiremos aqui os fatores de risco hormonais e metabólicos.


Algumas pessoas não sabem, mas o câncer de mama também pode acometer homens. Mas por quê a doença maligna da mama é 100 vezes mais frequente em mulheres? Devido ao efeito dos estrógenos, hormônios produzidos pelo ovário. O estradiol, o principal estrógeno, exerce efeito proliferativo sobre a mama e isto, por si só, já explica grande parte desse aumento de risco. Mulheres que tiveram a primeira menstruação cedo e a última tarde, acabam tendo uma exposição maior ao estradiol, com consequente aumento do risco de câncer. Os estrógenos fornecidos por via oral, em terapias de reposição hormonal, também podem aumentar o risco, devendo ser indicados com cautela. Isso quer dizer que a mulher deve procurar baixar seus níveis de estrógenos? Não. Isso seria antifisiológico. Essas informações servem para justificar e individualizar os programas de rastreamento de câncer de mama. Conhecendo a paciente, melhoramos a conduta médica.
Outros hormônios que podem estar associados ao aumento de risco são a testosterona e a insulina. Contudo, mais estudos são necessários para que se possa estimar melhor o efeito destes.
O principal fator de risco metabólico para o câncer de mama é o excesso de peso. O aumento do risco fica em torno de 20% e é explicado pelo aumento da produção de estradiol nas células gordurosas a partir de precursores estrogênicos. Além disso, o excesso de peso causa resistência a insulina, com consequente aumento deste hormônio, que como dito anteriormente, também é suspeito de causar malignidade na mama.
O tipo de alimentação ainda gera debate. Apesar de ainda inconclusivos, alguns estudos sugerem que o consumo de uma dieta rica em gordura e carne vermelha e pobre em vegetais e derivados da soja, possa aumentar o risco de câncer de mama.
Do ponto de vista prático, o endocrinologista pode ajudar a diminuir a incidência de câncer de mama, ajudando suas pacientes a perderem peso através de uma alimentação saudável e incentivando a prática de atividades físicas. Além disso, a tão falada terapia de reposição hormonal, deve ser prescrita de maneira criteriosa e não para toda mulher após a menopausa.


Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

domingo, 20 de setembro de 2015

Cistos de tireoide: avaliação e tratamento

Cistos ou nódulos císticos de tireoide são lesões parcial ou completamente preenchidas por fluido. São muito frequentes, podendo corresponder à metade dos nódulos tireoidianos. A maioria é assintomática e descoberta ao acaso, mas sintomas como dor ou sensação de aperto no pescoço podem ocorrer dependendo do tamanho da lesão.
De acordo com as células que os constituem, os nódulos císticos podem ser benignos (adenoma) ou malignos (carcinoma, isto é, câncer de tireoide). Felizmente, a grande maioria destas lesões é benigna. Estima-se que apenas 2 de cada 100 nódulos císticos sejam malignos. Além disso, as lesões com um componente cístico maior, isto é, com mais fluido do que células, têm um risco menor de serem malignas.

Ecografia de tireoide mostrando nódulo cístico

Na avaliação dos nódulos císticos de tireoide são fundamentais: a história clínica do paciente, a dosagem do TSH, a ecografia e a punção aspirativa com agulha fina (PAAF). Cistos simples só precisam ser puncionados se houver necessidade de drenagem, pois são virtualmente sempre benignos. Nódulos císticos com componente sólido devem ser puncionados quando maiores que 1,0-2,0 centímetros de diâmetro, dependendo de suas características à ecografia, para afastar o diagnóstico de câncer. Por exemplo, se o componente sólido for hipoecoico e com microcalcificações, o nódulo cístico precisará ser puncionado se tiver mais de 1 centímetro. Se o nódulo tiver aspecto esponjoso, só precisará ser puncionado se for maior que 2 centímetros.
O tratamento dos nódulos císticos de tireoide depende do resultado da PAAF. Lesões malignas devem ser retiradas através de cirurgia. Lesões benignas podem ter seu conteúdo líquido aspirado, serem operadas ou simplesmente observadas. Existe ainda a possibilidade de injeção de álcool dentro do cisto após a aspiração do fluido, especialmente quando o volume for grande ou se houve recidiva após uma primeira drenagem.
Se você tem qualquer lesão na tireoide, seja ela cística ou não, procure um endocrinologista para avaliação diagnóstica e terapêutica.


Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

domingo, 13 de setembro de 2015

Saiba quando desconfiar de baixa estatura

O que é baixa estatura?

Uma criança ou adolescente é considerada com baixa estatura quando está dois desvios-padrões abaixo da média idade e sexo, ou seja, quando fica fora dos canais de crescimento nos gráficos. Mais importante do que um medida isolada da estatura, são as medidas consecutivas, que dão informação sobre a velocidade de crescimento. O acompanhamento regular com o pediatra é fundamental para identificar quem necessita de avaliação complementar. Outra maneira de desconfiar de baixa estatura é observando se a criança tem a mesma altura que as outras da mesma idade, embora a avaliação através dos gráficos de crescimento seja muito mais apropriada.


Quais as causas de baixa estatura?

Existem diversas causas de baixa estatura. Estas vão desde doenças genéticas, doenças crônicas (anemia, asma, doenças renais e cardíacas, entre outras), problemas emocionais, doenças esqueléticas e doenças endocrinológicas (raquitismo, diabetes mellitus mal controlado, deficiência do hormônio do crescimento, hipotireoidismo, doenças da adrenal e distúrbios da puberdade).

Como é feita a avaliação da baixa estatura?

A avaliação é feita através da história detalhada desde o nascimento. São feitos questionamentos sobre medicamentos em uso, presença de doenças e desenvolvimento sexual. É importante, se possível, que ambos os pais compareçam a consulta, pois deverão ser medidos para calcular a altura alvo da criança. Dependendo da avaliação clínica inicial, podem ser pedidos exames gerais, além de raio-x da mão para avaliação da cartilagem de crescimento. Conforme os resultados dessa primeira leva de exames, podem ser necessários testes específicos para confirmação dos diferentes diagnósticos.

Como é feito o tratamento da baixa estatura?

O tratamento depende da causa, sendo que para algumas condições não existe tratamento específico. Por exemplo, na criança com hipotireoidismo, se repõe o hormônio tireoidiano; já na criança com diabetes, trata-se a doença apropriadamente.
Ao contrário do que se pensa, o hormônio do crescimento não está indicado para todas as crianças com problemas de crescimento e sim para aquelas com deficiência comprovada ou em grupos selecionados, como meninas com síndrome de Turner ou crianças com insuficiência renal crônica. O tratamento é mantido até o final do crescimento e em alguns casos indefinidamente.
Nas crianças que precisam de tratamento específico, quanto antes este for iniciado, melhores serão os resultados. Logo, quando se identifica ou se desconfia de problemas no crescimento, a avaliação deve ser imediata. Retardar a consulta, esperando que seu filho(a) vá crescer depois, pode trazer prejuízos irreparáveis a estatura final.

Se você ou o pediatra percebeu ou desconfia que seu filho(a) possa estar crescendo menos que o esperado, procure um endocrinologista.

Referência:
1- Rogol AD. Diagnostic approach to children and adolescents with short stature. UpToDate.

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Doutor e Mestre em Endocrinologia - UFRGS
CREMERS 30.576 - RQE 22.991
facebook.com/drmateusendocrino

Texto atualizado em 7 de abril de 2019.

domingo, 6 de setembro de 2015

Osteoporose: entenda e evite fraturas

O que é osteoporose?

Osteoporose é uma doença que deixa os ossos mais fracos, o que aumenta o risco de fraturas. Algumas vezes, uma simples queda da própria altura dentro de casa é suficiente para que o osso acometido pela osteoporose quebre.



Como se faz o diagnóstico de osteoporose?

A osteoporose não causa sintomas até que o osso quebre. Logo, a DENSITOMETRIA ÓSSEA, um tipo especial de raio-x, é necessária para fazer o diagnóstico. A densitometria óssea é recomendada para mulheres após os 65 anos e para homens após os 70 anos. Conforme avaliação médica, o exame também pode ser solicitado para pacientes com idade menor que 65 anos, que tenham fatores de risco, ou seja, condições que aumentem a chance de se ter osteoporose.

Os fatores de risco para osteoporose são:
- tabagismo;
- uso de corticoides;
- baixo peso;
- artrite reumatoide;
- história de fraturas prévias após pequenos traumas (queda da própria altura, por exemplo);
- abuso de álcool;
- doenças como diabetes mellitus, hipertireoidismo, hiperparatireoidismo, falência ovariana precoce (antigamente chamada de menopausa precoce), doenças que causam má absorção dos nutrientes no intestino e doenças do fígado.

Como se previne a osteoporose?

Ajudam a prevenir a osteoporose:
- comer alimentos ricos em cálcio como leite e derivados;
- comer alimentos ricos em vitamina D como leites fortificados e salmão;
- tomar sol moderadamente;
- fazer atividade física pelo menos 30 minutos por dia;
- não fumar;
- não beber em excesso.

Como se trata a osteoporose?

A osteoporose é tratada com uma ingestão adequada de cálcio e vitamina D e com remédios que ajudam a fortalecer o osso, chamados bisfosfonatos. Algumas vezes a osteoporose é causada por outra doença. Nestes casos, o tratamento é voltado primeiramente para esta causa.
O tratamento é avaliado em intervalos regulares de 1 a 3 anos através da densitometria óssea. Em alguns casos também podem ser pedidos exames de sangue e de urina.

Se você é mulher com mais de 65 anos, homem com mais de 70 anos ou possui fatores de risco para osteoporose, procure seu endocrinologista e faça uma avaliação.

Referência:
1- Yu EW. Screening for osteoporosis. UpToDate.

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Doutor e Mestre em Endocrinologia - UFRGS
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

Texto revisado em 17 de fevereiro de 2019.

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

De onde vêm os nódulos de tireoide?

Nódulos de tireoide são frequentes. Dependendo da população estudada, a prevalência deste problema pode chegar a 75 por cento! Após os 40 anos de idade, pelo menos uma em cada dez pessoas terá um nódulo tireoidiano. Apesar de serem comuns, os nódulos de tireoide acabam gerando apreensão, já que cerca de cinco por cento são malignos.
Grande parte dos pacientes com nódulos de tireoide faz a pergunta: "De onde veio este nódulo? Por que ele apareceu?". Apesar do grande avanço científico, esta pergunta não é tão simples de ser respondida...



Grande parte dos nódulos de tireoide, sejam eles benignos ou malignos, é causada por mutações em genes específicos. Por exemplo, pacientes com bócios multinodulares geralmente possuem nódulos coloides. Este tipo de nódulo é formado por clones celulares, ou seja, por uma população de células derivada de uma única ou de poucas células que se dividiram em um ritmo e um padrão diferente do restante da glândula  tireoide, levando à formação do tecido em formato de caroço, que chamamos de nódulo.
Muitas mutações genéticas que levam a esta proliferação celular desordenada já foram identificadas. No entanto, as causas exatas de cada mutação ainda estão sendo investigadas.
Apesar dos fatores desencadeadores da formação dos nódulos ainda não terem sido completamente identificados, existem alguns "suspeitos". Estão associados à presença de nódulos ou de bócio:
- tabagismo, especialmente em áreas deficientes de iodo.
- consumo regular de álcool, principalmente em mulheres.
- aumento da idade. Como dito anteriormente, pessoas mais idosas tendem a desenvolver mais nódulos.
- história de radioterapia ou transplante de medula óssea.
- níveis elevados de IGF-1, hormônio produzido no fígado através do qual o hormônio do crescimento atua nos diferentes tecidos.
- mulheres com miomas uterinos têm uma incidência maior de nódulos de tireoide.
Por outro lado, também existem fatores associados a uma menor ocorrência de nódulos. São eles:
- uso de pílula anticoncepcional.
- uso de estatinas (medicamento para redução do colesterol).
Por que cada um destes fatores favorece ou dificulta o surgimento das mutações genéticas que levam a multiplicação celular desorganizada e, consequentemente, aos nódulos, ainda é tema de estudos...
Apesar de não existirem recomendações específicas para prevenção de nódulos de tireoide, não custa abandonar o fumo e não abusar de bebidas alcoólicas, já que esses dois hábitos podem causar outros abalos à saúde. Fica a dica!
Fonte: UpToDate

Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576