Desde tempos remotos, aproveitadores usam do medo para tirar vantagem. Surtos e epidemias, como a do coronavírus, são um prato cheio para charlatões. Em meio a desinformação, maus profissionais oferecem tratamentos sem evidência de eficácia, fúteis e até mesmo deletérios com a única pretensão de lucrar. E a vitamina D, como sempre, surge para salvar a pátria... ou não!
É verdade que existem evidências experimentais de que a vitamina D possa ter efeito modulatório no sistema imunológico. Células de defesa como macrófagos e linfócitos expressam receptores para vitamina D. Além disso, existe a hipótese de que a diminuição nos níveis de vitamina D que acontece nos meses frios possa explicar o aumento no número de infecções respiratórias virais. Porém, defender o uso de vitamina D como estratégia de prevenção ao coronavírus é um equívoco! Explico...
Em 2017, o British Medical Journal publicou uma revisão de 25 estudos sobre o uso do vitamina D como estratégia de prevenção de doenças respiratórias agudas. No total, foram avaliados mais de 10 mil pacientes. O uso de vitamina D reduziu em 1,9 por cento a incidência de infecções especialmente nos pacientes com níveis abaixo de 10 ng/mL. No entanto, o uso da vitamina D não foi capaz de reduzir eventos adversos graves como pneumonias, necessidade de hospitalização ou morte. Esse estudo é frequentemente citado pelos enganadores, que o interpretam de forma equivocada ou enviesada. Vamos por partes...
O uso da vitamina D não foi 100 por cento eficaz. Aliás, ficou bem longe disso! Para cada 52 pacientes que fizeram uso do tratamento, apenas 1 se beneficiou. E esse benefício se restringiu a sintomas leves como coriza, tosse e febre. Outro detalhe, o uso de doses de ataque ou megadoses, frequentemente oferecidas pelos picaretas, não foi tão eficaz quanto a suplementação diária em doses habituais.
Vale ressaltar que o uso da vitamina D não foi estudado no contexto da epidemia do coronavírus, logo, os resultados do estudo acima não podem ser extrapolados. Não podemos afirmar que a vitamina D possa ajudar, ou mesmo que possa fazer mal neste contexto. Por isso, seu uso não é recomendado.
Pesquisadores sérios estão testando antivirais e vacinas contra o COVID-19 neste momento. Até que tenhamos os resultados destes estudos, a melhor estratégia de prevenção é evitar o contato com pessoas doentes, lavar as mãos e manter medidas de higiene respiratória (cobrir a boca ao tossir, se estiver doente). Vitamina D não é uma opção!
Referências:
1- World Health Organization. Director-General's remarks at the media briefing on 2019-nCoV on 11 February 2020. https://www.who.int/dg/speeches/detail/who-director-general-s-remarks-at-the-media-briefing-on-2019-ncov-on-11-february-2020 (Accessed on February 12, 2020).
2- Martineau AR, Jolliffe DA, Hooper RL, et al. Vitamin D supplementation to prevent acute respiratory tract infections: systematic review and meta-analysis of individual participant data. BMJ 2017; 356:i6583.
3- Martineau AR, Jolliffe DA, Greenberg L, et al. Vitamin D supplementation to prevent acute respiratory infections: individual participant data meta-analysis. Health Technol Assess 2019; 23:1.
Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista titulado pela SBEM
Doutor e Mestre em Endocrinologia pela UFRGS
CREMERS 30.576 - RQE 22.991
Santa Maria - RS
https://drmateusendocrino.com.br
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