domingo, 28 de fevereiro de 2016

Benefícios da sardinha enlatada na alimentação

A SARDINHA 🐟 em lata é o melhor exemplo de que não se precisa gastar uma nota 💸 para ter uma ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL. Por menos de 2 reais, você tem um alimento rico em PROTEÍNAS, gordura ÔMEGA 3, CÁLCIO e VITAMINA D. Para MULHERES no período perimenopausa que desejam manter a massa óssea 💀 em dia, a sardinha é uma ótima aliada. Quem está treinando para aumentar a massa muscular 💪🏻 também se beneficia do consumo regular. Uma dica para quem não gosta do sabor: tempere com limão, cúrcuma, pimenta ou cominho.


Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Vale a pena investir em sucos funcionais?

Hoje um texto um pouquinho diferente: também sou consumidor!
Andando entre as gôndolas do supermercado, garrafas bonitas (fotos abaixo) me chamaram a atenção. Quando o assunto é  "bebidas industrializadas", um embalagem bonita não costuma ser suficiente para me convencer que o produto é saudável. Para não comprar gato por lebre, sempre leio a lista de ingredientes e a tabela nutricional do produto. Diferente da grande maioria das bebidas de frutas disponíveis no comércio, estas realmente são sucos, isto é, são feitas exclusivamente com componentes vegetais, com exceção da versão suplementada com colágeno. Isto é algo bom, pois não há açúcar adicionado.




Na lista de ingredientes não encontrei conservantes: outro ponto positivo. No entanto, diferente dos sucos naturais, que são preparados com as frutas de verdade, as benéficas fibras estão praticamente ausentes nestas versões industrializadas. As fibras são importantes pois ajudam a diminuir o índice glicêmico da bebida, isto é, fazem com que os açúcares sejam absorvidos de maneira mais lenta, evitando assim picos de glicose na corrente sanguínea e hiperestimulação do pâncreas.
A versão com frutas vermelhas e roxas é a mais interessante. Morango, mirtilo, amora, framboesa, açaí e uvas escuras mostraram-se benéficas em diversos estudos. Seu potencial antioxidante protege inclusive os neurônios, ajudando a prevenir demências.
A versão dita "detox" é a que apresenta a maior lista de componentes vegetais. Contudo, não há evidência de que sucos ajudem a desintoxicar o  organismo. Intestino, fígado e rins costumam dar conta do recado. Dentro de uma alimentação balanceada, se substituir escolhas menos saudáveis, o suco pode dar uma força. Não por eliminar toxinas, mas por evitar o consumo destas.
A versão com colágeno é a menos interessante tanto pela falta de evidências sólidas de benefício quanto pela baixa concentração presente por porção nesta bebida. Para quem é vegetariano, esta versão com colágeno é um "pegadinha", diga-se de passagem.
Acabei colocando as três versões no carrinho e trazendo pra casa, apenas para experimentar. Como costumo comer regularmente as frutinhas vermelhas e roxas, não vejo vantagem em consumir este tipo de bebida. Quanto à versão "detox", prefiro evitar abusos alimentares, ter um alimentação balanceada e cuidar bem do meu fígado, intestino e rins. Por fim, um franguinho grelhado pode dar conta do colágeno de forma mais eficiente que um suco. E para matar a sede? Melhor é água! Bebidas saciam pouco. E as calorias extras podem virar quilos extras.
Em resumo, a relação custo benefício deste tipo de bebida não é das melhores. Muito dinheiro gasto para pouco retorno em saúde. Só vale a pena, se você estiver com intenção de levar refrigerantes ou néctares ("sucos" de caixinha) cheios de açúcar para casa.

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576


domingo, 14 de fevereiro de 2016

Hipotireoidismo e obesidade: qual o tamanho da culpa da tireoide no excesso de peso?

Este é um dos conceitos mais equivocados não só na Endocrinologia como na Medicina: hipotireoidismo causa obesidade. Não é bem assim!
O hipotireoidismo é caracterizado pela diminuição na produção de hormônios pela tireoide. Os hormônios tireoidianos (T4 e T3) regulam diversas funções metabólicas do organismo, entre elas o manejo de substâncias chamadas glicosaminoglicanos. Quando ocorre deficiência dos hormônios tireoidianos, os glicosaminoglicanos se acumulam nos diferentes tecidos do corpo. Junto com esse acúmulo, ocorre retenção de água. Este é o ponto! Na realidade, a grande responsável pelo ganho de peso no hipotireoidismo é a água.


Diversos estudos mostram que o ganho de peso associado ao hipotireoidismo é discreto. A maioria das pessoas com hipotireoidismo no máximo 10% de peso, ou seja, cerca de 5 quilos.
Outra informação importante: mesmo indivíduos com hipotireoidismo grave, isto é, com valores muito baixos de hormônios tireoidianos, quando são devidamente tratados e acompanhados por período de 1 ano, perdem cerca de 4 quilos. A avaliação da composição corporal destes pacientes mostra que a diminuição do peso realmente ocorre por perda de água e não de gordura.
Além disso, pessoas com obesidade, geralmente estão mais de 15 quilos acima do peso. Ou seja, mesmo que se identifique hipotireoidismo nestes pacientes, o tratamento da disfunção tireoidiana unicamente não vai resolver o problema do excesso do peso.
Em resumo, quando se refere a excesso de peso, a tireoide, na maioria das vezes, tem pouca ou nenhuma culpa. E os verdadeiros culpados não podem passar despercebidos. A alimentação inapropriada e o sedentarismo devem ser identificados e combatidos. O sucesso do tratamento depende disso.

Referência:
1- Surks MI. Clinical manifestations of hypothyroidism. UpToDate.

O tratamento da HIPOTIREOIDISMO com levotiroxina pode causar ganho de peso?



Dr. Mateus Dornelles Severo
Médico Endocrinologista
Doutor e Mestre em Endocrinologia - UFRGS
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

Texto revisado em 5 de maio de 2019.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Tratamento do hipotireoidismo: existe espaço para reposição de T3?

A diminuição da produção de hormônio por parte da tireoide tem um tratamento simples, eficaz e barato: a reposição de T4 ou levotiroxina. No entanto, algumas pessoas (cerca de 10 por cento) ainda queixam sintomas mesmo quando a reposição parece estar adequada, com os níveis de TSH dentro da faixa terapêutica para o grupo etário do paciente. Esta observação levantou a hipótese que estas pessoas poderiam se beneficiar de outro tipo de abordagem, isto é, a reposição adicional de T3 ou liotironina. Alguns estudos já avaliaram este tratamento, vejamos os principais...
 
 

Uma extensa revisão da literatura selecionou 11 estudos com qualidade aceitável que comparavam reposição de T4 isolada a reposição de T4 + T3. Mais de 1200 pacientes foram avaliados quanto a dores no corpo, sintomas de depressão ou ansiedade, fadiga, qualidade de vida, peso, colesterol, triglicerídeos e efeitos adversos. Não houve diferença alguma entre os grupos, isto é, quanto a eficácia para alívio de sintomas, os tratamentos foram iguais.
Um estudo menor, com 141 pacientes, que também comparou a reposição de T4 isolada à reposição de T4 + T3, mostrou resultados parecidos com relação ao alívio de sintomas. No entanto, ao final do estudo, mais pacientes preferiram a terapia combinada. Um análise detalhada dos dados mostrou que 44 por cento dos pacientes que preferiram a terapia combinada ficaram discretamente hipertireoideos e consequentemente perderam em média 1,8 quilos de peso. Isto é, o desenvolvimento de hipertireoidismo decorrente do tratamento combinado, levou a perda de peso e esta percepção de "emagrecimento" fez os pacientes preferirem o tratamento combinado de T4 + T3. Aqui cabe a ressalva que a perda de peso foi consequência de tratamento excessivo, o que pode ser prejudicial a saúde em longo prazo.
Por fim, as preparações de T3 comercialmente disponíveis são de absorção rápida, isto é, após ingeridas, atingem com facilidade a corrente sanguínea. Devido a isto, existe muita flutuação nos níveis séricos de T3, o que pode tornar difícil o ajuste de dose. Alguns pacientes podem em virtude disso apresentar queda nos níveis de T4 e elevação do TSH, ou seja, tendência a piorar o hipotireoidismo.
Por fim, apesar do uso de T3 combinado ao T4 não ser útil para o tratamento da maioria dos pacientes com hipotireoidismo, talvez algumas pessoas possam se beneficiar desta terapia. Alguns pacientes com polimorfismos no gene da deionidase tipo 2 têm dificuldade na conversão do T4 em T3 no organismo. A reposição combinada de T4 + T3 nestes indivíduos foi favorável no alívio de sintomas. No entanto, os dados ainda são preliminares e precisam ser replicados para que se formalize esta indicação. Além disso, os testes genéticos para pesquisa dos polimorfismos da deionidase tipo 2 são poucos disponíveis fora do contexto de pesquisa e o simples exame clínico e laboratorial convencional não conseguem identificar corretamente os portadores da mutação.

Fontes:
1- Grozinsky-Glasberg S, Fraser A, Nahshoni E, Weizman A, Leibovici L. Thyroxine-triiodothyronine combination therapy versus thyroxine monotherapy for clinical hypothyroidism: meta-analysis of randomized controlled trials. J Clin Endocrinol Metab. 2006;91(7):2592.
2- Appelhof BC, Fliers E, Wekking EM, Schene AH, Huyser J, Tijssen JG, Endert E, van Weert HC, Wiersinga WM. Combined therapy with levothyroxine and liothyronine in two ratios, compared with levothyroxine monotherapy in primary hypothyroidism: a double-blind, randomized, controlled clinical trial. J Clin Endocrinol Metab. 2005;90(5):2666.
3- Panicker V, Saravanan P, Vaidya B, Evans J, Hattersley AT, Frayling TM, Dayan CM. Common variation in the DIO2 gene predicts baseline psychological well-being and response to combination thyroxine plus triiodothyronine therapy in hypothyroid patients. J Clin Endocrinol Metab. 2009;94(5):1623.
 
 
Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Câncer papilífero de tireoide

Na avaliação do nódulo de tireoide, a maior preocupação do médico endocrinologista é identificar lesões potencialmente malignas, isto é, câncer de tireoide. Diferentes estudos mostram aumento da incidência do câncer de tireoide, especialmente do tipo papilífero. Nos Estados Unidos, 12 em cada 100 mil pessoas foram diagnosticadas com carcinoma papilífero de tireoide em 2009 contra apenas 3 em 1935. Este aumento de 4 vezes possivelmente se deva ao diagnóstico precoce de tumores cada vez menores graças ao desenvolvimento de métodos de imagem mais sofisticados. Mulheres principalmente entre 40 e 60 anos têm risco maior de desenvolver este tipo de câncer.
Entre os fatores de risco para carcinoma papilífero de tireoide estão exposição a radiação e história familiar positiva, principalmente. Alterações em genes das células tireoidianas acabam por levar ao seu crescimento desordenado, causando o câncer.



Antigamente, a maioria dos tumores papilíferos de tireoide se apresentava como nódulos na região anterior do pescoço, logo abaixo do pomo-de-Adão. Estes nódulos poderiam inclusive ter crescimento rápido e aderências a estruturas próximas como a laringe, levando a rouquidão. Adenomegalias (ínguas) palpáveis também poderiam compor o quadro. Hoje, grande parte dos carcinomas papilíferos são diagnosticados em fase pré-clínica, isto é, ainda sem causar sintomas, graças a exames como a ecografia (ultrassonografia) e a punção aspirativa com agulha fina (PAAF). Apesar do diagnóstico vir sendo feito em estágio cada vez mais precoce, cinquenta a oitenta porcento dos pacientes pode apresentar metástases para os linfonodos do pescoço, e dois a dez porcento pode apresentar metástases em pulmões ou ossos, principalmente.
Mesmo sendo localmente invasivo, o carcinoma papilífero costuma ter bom prognóstico. A grande maioria dos pacientes com este tipo de câncer não costuma morrer ou sofrer desta doença. Alguns fatores parecem ser importantes na avaliação do prognóstico. Pacientes diagnosticados entre 20 e 45 anos de idade dificilmente morrerão por causa do carcinoma papilífero. Pacientes com tumores com menos de 4 centímetros também tem excelente expectativa de vida. Por outro lado, quando o tumor invade estruturas do pescoço como músculos, traqueia ou esôfago, o risco de morte aumenta 5 vezes. Outros fatores que aumentam o risco de recidiva ou morte são metástases à distância, muitos linfonodos comprometidos, sexo masculino e atraso na realização da cirurgia para retirada do tumor.
O tratamento primário para o câncer papilífero de tireoide é a cirurgia. Logo após a retirada cirúrgica do tumor, o paciente deve ser devidamente estadiado, isto é, deve ter a gravidade da doença "medida" para que se possa programar a melhor abordagem terapêutica e de seguimento. Geralmente, o paciente recebe uma dose de iodo radioativo e doses supressivas de hormônio tireoidiano. Inicia-se também acompanhamento regular, que visa, além de monitorar a doença através de exames periódicos de imagem e de laboratório, evitar tratamentos excessivos e desnecessários, prezando principalmente pela qualidade de vida do paciente.

Fonte: Overview of papilary thyroid cancer - UpToDate OnLine

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

sábado, 16 de janeiro de 2016

Limitações na interpretação da hemoglobina glicada (HbA1c)

A HbA1c é a medida da hemoglobina glicada. Trata-se de um exame importante tanto para o diagnóstico quanto para o seguimento do paciente diabético já que reflete os níveis glicêmicos nos últimos 2-3 meses. Contudo, apesar de os métodos laboratoriais terem evoluído bastante, a interpretação da dosagem da HbA1c ainda requer atenção por parte do médico endocrinologista, especialmente nos casos em que os valores da monitorização da glicemia capilar (em ponta de dedo) são discrepantes.



A HbA1c resulta da glicação irreversível não enzimática da cadeia beta da hemoglobina. Complicado? Nem tanto! A hemoglobina tem função de carregar o oxigênio captado nos pulmões aos nossos diferentes tecidos. Quando os níveis de glicose se elevam muito no sangue, o processo de glicação se intensifica, fazendo com que a proporção de HbA1c também aumente. No entanto, pode haver interferência no processo de glicação. Além disso, condições que aumentam ou diminuem a vida da hemácia (célula vermelha que contém a hemoglobina), variantes de hemoglobinas e hemoglobinas modificadas quimicamente são causas de variabilidade no exame.
Condições de diminuem a vida da hemácia, tais como anemias hemolíticas (anemia com destruição das células vermelhas), doença renal crônica, hemodiálise e gravidez, causam falsa redução nos níveis de HbA1c. Isto é, o médico endocrinologista deve tomar cuidado para não interpretar como melhora no controle do diabetes uma redução na hemoglobina glicada causada por estas condições. Condições que aumentam a formação de novas células vermelhas também podem causar falsa redução nos níveis de HbA1c. Entre elas podemos citar o uso de eritropoetina (estimulador das células vermelhas comumente usado em pacientes com doença renal crônica) e a perda de sangue. Além disso, transfusões sanguíneas costumam refletir a HbA1c do doador.
Por outro lado, existem condições que elevam falsamente a HbA1c podendo sugerir piora do controle glicêmico sem que isto tenha de fato ocorrido. Doenças que aumentam a vida das hemácias podem ser causa desse quadro, tais como anemia por deficiência de ferro, ácido fólico ou B12. A retirada cirúrgica do baço, ou esplenectomia, tem efeito similar a estas anemias na HbA1c. Além disso, modificações químicas da hemoglobina causadas por doses elevadas de AAS (hemoglobina acetilada) ou níveis elevados de ureia (hemoglobina carbamilada) também podem ser causas de falsa elevação da HbA1c.
Por fim, variantes da hemoglobina (S, C, E e F), doenças como anemia falsiforme e talassemias podem causar dificuldades na interpretação da HbA1c, tanto elevando como reduzindo falsamente seus níveis. Pacientes com história familiar destas doenças, afrodescendentes e asiáticos devem ser cuidadosamente avaliados.
A correta interpretação do exame, bem como a identificação dos possíveis fatores interferentes, é de fundamental importância para o ótimo controle do diabetes, garantindo que o paciente receba tratamento na medida certa! Nem mais nem menos!

Fonte: South Med J. 2015;108(12):724-729. 

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576

domingo, 13 de dezembro de 2015

Fadiga adrenal: cuidado para não receber o diagnóstico de uma doença falsa

Entre os sintomas mais comuns nos dias de hoje estão a fadiga e o estresse. Quando percebe-se que os níveis de energia estão baixos, as pessoas buscam por respostas e soluções. Algumas procuram por uma “bala mágica” e acreditam que o complexo vitamínico correto será capaz de restabelecer o vigor. Outras querem saber se existem medicamentos ou estimulantes para tratar o quadro. A verdade é que a avaliação de sintomas vagos pode ser um verdadeiro desafio. Muitos de nós temos vidas movimentadas, que por vezes não nos permitem praticar exercícios ou mesmo dormir de forma adequada. A alimentação também acaba prejudicada pela falta de tempo e pela conveniência. A fadiga e o estresse podem fazer parte da vida, mas também podem ser sintomas de doenças mais graves. É justamente o fato de serem sintomas inespecíficos que tornam sua avaliação e tratamento, algumas vezes, não tão fáceis.
Para alguns defensores de “práticas alternativas”, esses sintomas vagos e inespecíficos foram agrupados em uma “doença inventada”, a “fadiga adrenal”. Contudo, não há até o momento qualquer evidência de que a “fadiga adrenal” exista como patologia. A Endocrine Society, uma das mais respeitadas organizações médicas do mundo, posicionou-se sobre o assunto recentemente:
“A fadiga adrenal não é uma condição médica real. Não existem fatos científicos para suportar a teoria que estresse físico, mental ou emocional esgotem as glândulas adrenais e causem sintomas.”


Palavras inequívocas! Mas a medicina baseada em evidências é ainda mais categórica em refutar uma doença falsa...
As adrenais são um par de glândulas localizadas uma sobre cada rim e produzem diversos hormônios, entre eles os hormônios do estresse adrenalina, noradrenalina e cortisol. Será que estas glândulas podem cansar se estimuladas em excesso? Mesmo na ausência de qualquer fato científico, o naturopata James Wilson cunhou o termo “fadiga adrenal” em um livro publicado em 1998. Dê uma olhada no questionário de Wilson abaixo. Você apresenta algum destes sintomas?
1- Cansado sem razão aparente.
2- Dificuldade em acordar de manhã.
3- Necessidade de café, refrigerantes tipo cola, doces ou salgadinhos para ter energia.
4- Sentindo-se para baixo ou estressado.
5- Fissurado em doces ou salgadinhos.
6- Lutando para manter as tarefas de rotina.
7- Não consegue se desenvencilhar do estresse e da doença.
8- Não se diverte.
9- Não tem vontade em manter relações sexuais.
Segundo Wilson, se você convive com qualquer um desses sintomas, você tem “fadiga adrenal”, a “doença falsa” mais prevalente no mundo, já que dificilmente alguém já não apresentou algum desses sintomas.
Porém, este questionário jamais foi validado, não existem provas nem literatura pertinente que possam embasá-lo. Uma busca detalhada na base de estudos médicos Pubmed com os termos “adrenal” AND “fatigue” retorna apenas um resultado relevante, que é uma revisão que não cita as fontes revisadas!
Doenças falsas são agrupamentos de diferentes sintomas dentro de condições sem nenhum embasamento científico. É da natureza do ser humano querer entender os padrões das doenças para propor tratamentos. Porém, definir um simples grupo de sintomas é o primeiro erro nesse processo de compreensão. Isto porque os sintomas precisam ser organizados de uma maneira racional para fazerem sentido dentro de uma síndrome clínica. No caso da “fadiga adrenal”, não existe esta explicação racional da progressão e gravidade dos diferentes sintomas, apenas um agrupamento simples. O segundo grande erro é usar uma lista desorganizada de sintomas para identificar pacientes com a doença. O terceiro erro é usar testes laboratoriais em sangue ou saliva, com suas diversas complicações metodológicas, para diagnosticar uma patologia que não é ao menos descrita de forma apropriada. Por fim, o pior de todos os erros é propor tratamento, seja ele qual for, para algo pobremente definido. Como saber se algo tão “amorfo” está melhorando ou piorando com um tratamento? Como saber se o próprio tratamento não está fazendo mal?
Enquanto a “fadiga adrenal” não existe, os sintomas que muitas pessoas apresentam são sim reais. Estes mesmos sintomas podem ser causados por doenças verdadeiras como apneia do sono, hipotireoidismo, diabetes, depressão, anemia, insuficiência adrenal, neoplasias, entre outras. Ao aceitar o diagnóstico de uma “doença falsa” perde-se tempo em realizar o diagnóstico correto de algo que pode ser potencialmente grave. Por fim, pode ser frustrante apresentar sintomas e após uma avaliação médica pormenorizada não se identificar uma causa. Mas esta situação é melhor do que ter a distração de tratar uma condição fictícia.


Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
Mestre em Endocrinologia
CREMERS 30.576